quinta-feira, 4 de abril de 2013

Deselegante Dor

Dói tanto, tanto. Começa fininha, vai entrando pelos poros e em pouco tempo se espalha pelo corpo todo. Uma dor que se concentra no coração e vai destruindo toda e qualquer resistência que possa haver, transformando anticorpos em mini partículas de um vírus que diariamente corrói a minha alma. E sabe qual a parte mais difícil? Ter que. Ter que continuar quando tudo dentro de mim parou. Ter que sorrir enquanto a vida me dói. Ter que encontrar um lugar pro medo, pra solidão, pro desespero. As lágrimas, essas são mais sabeis, quando não encontram um espaço - pequeno que seja - onde possam se hospedar, saem derrubando tudo pela frente, onde quer que estejam deixando explicito um rosto marcado pela dor.


Talvez aconteça exatamente como você disse - ou desejou. Talvez, eu não saia daqui deste lugar, nunca mais. Sim, talvez sim, talvez eu me foda, como você também desejou publicamente. O que, por sinal, me fez pensar pra onde será que você foi? Em que outra galáxia podemos nos encontrar novamente? Porque não, a pessoa que escreveu aquilo, não é você. Não foi você. Não, eu sei que não. Então, me diz, onde você está? Me diz, me conta, me acha ou me deixa achar você.

[S.Botelho]







Não sei se as pessoas choram de forma

diferente umas das outras,
eu choro contraída, como se alguém,
estivesse perfurando minha alma com uma
lâmina enferrujada,
choro como quem implora,
pare, não posso mais suportar.
Eu chorei no domingo,
na segunda,
na terça,
em várias partes do dia
e da noite,
um choro de quem pede clemência,
de quem está sendo confrontado com a morte,
eu estava abandonando uma vida
que não teria mais,
eu sofria minha própria despedida

[Martha Medeiros]

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Entre aspas


"Podia ser só amizade,
paixão,
carinho,
admiração,
respeito,
ternura,
tesão.
Com tantos sentimentos arrumados
cuidadosamente na prateleira de cima,
tinha de ser justo amor, meu Deus?"

[Caio Fernando Abreu]

domingo, 19 de junho de 2011

Não me encontre, eu encontro você


Eu estava totalmente imersa dentro daquele livro e do balanço daquele ônibus, que ora enjoava, ora dava a sensação de que estava perdida e sozinha em alto mar, quando subitamente fui raptada invadida agredida rasgada pela sua presença. Minha respiração ofegante disputou lugar com o descompasso do coração. As palavras que ia lendo se despedaçavam na minha frente, deixando de fazer qualquer sentido, e paralisando o meu mundo, para que você, mais uma vez, penetrasse lentamente nele.

Fechei os olhos e não me coube qualquer outra opção a não ser render-me àquele encontro. Você segurava diversas coisas em uma das mãos e utilizou a outra para se apoiar, deixando que em alguns momentos a pele quente do seu antebraço tocasse o meu rosto que permanecia cabisbaixo. Não sei se me identificou com a mesma rapidez que eu. Na verdade, não sei nem se você me identificou. E confesso, não sei nem se era mesmo você. Mas penso, quem mais meu Deus, quem mais nesse mundo deserto teria aquele cheiro e aquela mão inundada de tanta delicadeza?

O máximo que fui capaz de fazer foi levantar levemente os olhos e me reencontrar com todas aquelas linhazinhas desenhadas com uma ponta 0.5 na sua pele. Linhas tão bem decoradas por mim. Desta vez fechei os olhos e o livro, apertando-o contra o meu peito. Fiquei com medo de que numa tentativa de distração você baixasse a cabeça e lesse uma frase qualquer do meu livro e dentro de um susto também pensasse, meu Deus, quem mais nesse mundo deserto leria esse tipo de coisa?

Acho que no fundo, eu não queria que me visse ali. Eu estava feia e despreparada. Então fiquei assim, abraçada ao livro, e dormi, acredita? É, eu dormi. E ainda consegui sonhar. Nós estávamos rindo, rindo, rindo e no canto dos meus olhos formavam aquelas lágrimas de alegria que você adorava e costumava secar sempre com a ponta do dedo indicador. Você fez isso, claro. E depois desse seu gesto ficamos nos olhando enquanto nossas bocas diziam em silêncio um para o outro, amo você.

Acordei com o moço que sentava ao lado pedindo licença pra sair, pra passar, não sei ao certo. Meio desnorteada tentando compreender onde terminava o sonho pra voltar à realidade, virei o corpo pra que ele se fosse e corajosa, procurei por você. Não havia mais nada. Nem o seu cheiro, nem os seus passos marcados no chão. Olhei pra cada um daqueles rostos expostos dentro do ônibus, que me levava sei lá pra onde àquela altura, mas em nenhum deles havia absolutamente nada de você. Nem mesmo o seu silêncio. E nem sequer a sua ausência.

Olhei cansada para o livro fechado e de mãos dadas com ele descemos em câmera lenta num ponto qualquer da cidade, perdidos, enquanto o ônibus se afastava, levando com ele um pouquinho de mim e de você, juntos novamente.



[S.Botelho]






Lembrei dos dias que passei sem ela. Dias em que encontrar, por acaso,
um fio de seu cabelo preso na fronha do travesseiro bastava para me
encher de angústia e dor. Estive a ponto de rastejar.
Atire a primeira pedra aquele que não estremeceu ao recuperar,
nos lençóis encardidos da cama em que dorme solitário,
o cheiro da mulher ausente.

[do livro "Eu receberia as piores noticias dos seus lindos labios"]








A única coisa anormal era a minha vida sem ela.
Nunca prometemos nada um ao outro,
eu sabia que podia acabar de repente.
Como um poema que cessa antes de virar a página.

[do livro "Eu receberia as piores noticias dos seus lindos labios"]

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Eu me dôo inteira


– Só sei que nós nos amamos muito…
– Porque você está usando o verbo no presente? Você ainda me ama?
– Não, eu falei no passado!
– Curioso né? É a mesma conjugação.
– Que língua doida! Quer dizer que NÓS estamos condenados a amar para sempre?
(…)
– E não é o que acontece? Digo, nosso amor nunca acaba, o que acaba são as relações…

– Pensar assim me assusta.
– Por que? Você acha isso ruim?
– É que nessas coisas de amor eu sempre dôo demais…
– Você usou o verbo ‘doer’ ou ‘doar’?
(Pausa)
– Pois é, também dá no mesmo…

[Caio F.]